Foi um artigo que disputou imensa curiosidade entre o universo Rioavista, prova disso são as mais de 2500 visitas que o nosso blog recebeu sobre este assunto.
Independentemente das opiniões, há um facto que não muda para mim: isto é uma incompatibilidade total, sem espaço para interpretações.
Um trabalhador vende parte de uma empresa a outra entidade, e depois é nomeado Presidente da empresa compradora?
Onde está a independência?
Onde está a separação de funções?
Onde está a defesa dos interesses do Rio Ave Futebol Clube e dos seus sócios?
Mas deixemos, por momentos, o caminho que levou a este desfecho — previsível, diga-se — e olhemos para os casos concretos que mostram, de forma inequívoca, a gravidade da situação.
Imaginemos a seguinte situação:
1. A questão da renda e da tempestade “Martinho”
Na sequência da tempestade “Martinho”, a Direção do Clube, presidida por Alexandrina Cruz, decidiu aplicar um desconto na renda mensal paga pela SAD ao Clube.
Esse desconto será refletido nos relatórios e contas da época anterior e da atual (no mínimo). Isto foi-nos informado pela própria na assembleia de Junho.
A justificação apresentada aos sócios na Assembleia foi clara:
2. O terreno cedido pela Câmara Municipal
Em julho passado, a Câmara Municipal de Vila do Conde cedeu ao Rio Ave FC um terreno de 17 mil metros quadrados.
Pouco depois, o Clube cedeu esse mesmo terreno à SAD para usufruto, entidade arrendatária do Estádio dos Arcos.
Traduzindo em números:
A SAD, que pagava 15 mil euros anuais ao Clube pelo uso das instalações, passou a usufruir de mais 17 mil metros quadrados — sem que se saiba se o valor da renda foi atualizado.
3. E agora?
A pergunta impõe-se:
Irá a Presidente do Rio Ave FC exigir à SAD — presidida pela mesma pessoa — um aumento da renda anual?
Como é que esse processo se desenrolará?
Veremos Alexandrina Cruz, na qualidade de Presidente do Clube, a propor um aumento?
E, logo de seguida, na qualidade de Presidente da SAD, a rejeitá-lo?
Irá defender duas posições opostas, em duas cadeiras diferentes, na mesma sala?
Poderá surgir o argumento de que a SAD está a investir valores significativos nas infraestruturas e que, no futuro, essas mesmas infraestruturas reverterão para o clube.
Mas será que o acordo parassocial foi tornado público, de forma a garantir que essa salvaguarda está realmente assegurada?
De acordo com declarações da própria Alexandrina Cruz, numa assembleia geral, a SAD pode renovar o contrato de exploração dos terrenos por períodos sucessivos de cinco anos, sem limite para o número de renovações.
Isto significa que, caso assim o entenda, a SAD poderá continuar a explorar os terrenos — que pertencem ao clube — por tempo indeterminado.
Em termos práticos, poderemos vir a ter a SAD a explorar mais de 17 mil metros quadrados sem que o clube veja um único euro adicional de renda, e sem que, no futuro, as benfeitorias realizadas revertam efetivamente para o Rio Ave FC.
Por outro lado, importa questionar: irá a Presidente do Clube exigir a si própria, enquanto líder da SAD, que o Rio Ave FC tenha mais espaço disponível para as suas escolinhas, numa altura em que faltam campos para tantos jovens interessados?
E se a SAD se opuser, Alexandrina Cruz dirá “não” ao seu novo empregador?
A verdade é que esta duplicidade de funções é insustentável (pouco interessa se é ou não executiva - fontes minhas dizem que não).
É um conflito de interesses evidente, que coloca em causa a autonomia, a transparência e a defesa dos interesses do Rio Ave FC.
Mais grave ainda é a passividade com que a restante Direção do Clube assiste a tudo isto, como se fosse algo normal.
Não é normal.
Não pode ser visto como positivo.
E muito menos pode ser aceite em silêncio.
Como é que o Clube lutará pelos seus interesses quando quem o representa é a mesma pessoa que lidera a entidade que pode ter interesses opostos?
O Rio Ave FC merece uma liderança independente, transparente e unicamente comprometida com o Clube e com os seus sócios.
Por isso, Alexandrina Cruz deve apresentar mesmo a sua demissão do cargo de Presidente do Rio Ave FC.
Não sei se lhe passará pela cabeça pedir um voto de confiança na próxima Assembleia, mas todos sabemos como é que a sala das assembleias se enche em momentos decisivos - seria atirar areia para os olhos, seria mais um teatro.
Deve mesmo apresentar a demissão.
Tudo o resto é fazer de conta.