31.10.25

Muitos gastos: Falta planeamento e falta rigor na orçamentação. O que dizem os números do Relatório e Contas de 2024/2025

O Relatório e Contas do exercício de 2024/2025 do Rio Ave FC revela vários pontos que merecem uma análise cuidada. Há crescimento, é verdade — mas também há muita coisa que levanta dúvidas sobre planeamento, rigor e sustentabilidade.

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Rendimentos

O clube apresentou rendimentos totais de cerca de 960 mil euros, um aumento de 84% face ao ano anterior.
À primeira vista, o número impressiona. Mas ao olhar com mais atenção, percebe-se que este crescimento é sustentado quase exclusivamente por três fontes:

  • o arrendamento da SAD, e

  • o subsídio da UEFA, que passou de 5 mil euros para 170 mil euros e uma verba da seguradora de cerca de 160 mil euros.

Ora, este rendimento da UEFA e seguradora não é recorrente nem garantido. Se retirássemos apenas esse valor extraordinário, o resultado seria negativo.

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Gastos

Os gastos totais ascenderam a 670 mil euros, um aumento de 70%.
Curiosamente, a própria Direção tinha apresentado em junho do ano passado uma previsão de 556 mil euros.
Na prática, gastou mais 115 mil euros do que disse aos sócios, ou seja, mais 20% do que estava orçamentado.

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Análise Detalhada

  • Vendas de mercadorias caíram 59,4%, uma quebra de 63 mil euros. É provável que parte, ou até a totalidade, desta receita tenha sido absorvida pela SAD — por exemplo, através da venda das camisolas oficiais.


  • As receitas de Prestações de Serviços (quotas dos sócios e mensalidades das escolinhas) voltaram a cair, repetindo o cenário do exercício anterior.

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Quotizações e Mensalidades

  1. As receitas de quotização mantêm-se praticamente inalteradas, apesar de o clube ter promovido uma campanha de pagamento anual de quotas que descreveu como um sucesso.
    Isto significa que, tendo em conta o adiantamento de verbas, a receita real voltou a cair. E isto num contexto em que o número de sócios praticamente duplicou face a 2022/2023.
    Em resumo: desde então, as receitas da quotização diminuíram mais de 10%.



  1. Esta direção previa 215 mil euros em receitas de quotas, mas o valor real foi 162 mil euros — uma diferença de 25% abaixo do previsto.



  1. As mensalidades caíram de €84.595 para €69.807 (-17%). Como o valor mensal cobrado não diminuiu (ainda que haja uma equipa - sub 15 C - que tenha sido extinta), isso significa que há menos atletas nas escolas Rioavistas — ou então muitos pais deixaram de pagar.



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Outros Rendimentos (SAD)

  • Arrendamento do Estádio: €67.500
    (A direção perdoou €22.500 à SAD devido à “tempestade Martinho”)

  • Arrendamento da Academia: €90.000

Importa recordar que a SAD foi criada em maio de 2024, o que significa que teria de pagar pelo menos mais um ou dois meses que deveriam ter entrado no relatório anterior.

Questionei pessoalmente a Presidente Alexandrina Cruz, que explicou que, “por uma questão de timing”, o pagamento não tinha vencido.

Pois bem — também não entrou neste exercício.

Conclusão: além dos €22.500 perdoados, esta Direção deixou por cobrar entre 15 e 30 mil euros referentes ao exercício anterior.

NOTA: Alexandrina Cruz tinha dito e projetado em Maio de 2024 (Ponto 6): "Na eventualidade de, por imposições regulamentares a SAD não poder utilizar o Estádio, por falta de licenciamento, a renda continuará a ser paga ao clube".



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Fornecimentos e Serviços Externos (FSE)

Talvez nem todos saibam o que esta rubrica significa, mas engloba praticamente tudo o que o clube paga a entidades externas — desde serviços profissionais a refeições, compras, representação, vigilância, etc.

E aqui é onde os números verdadeiramente explodem:
Os custos com FSE aumentaram 88%, passando de €267 mil para mais de €503 mil.


A direção tem dito que “a aposta foi o futsal”, mas, se olharmos para os números, os ordenados estão dentro da previsão feita em junho passado.
Portanto, a pergunta é: onde foi gasto todo este dinheiro?

Destaques:

  1. Vigilância e segurança: +96%

    • De 7 mil para 14 mil euros

    • Estimativa inicial: €6.600

    • A Presidente afirmou em maio de 2024 que “todas as despesas de segurança do Estádio e da Academia seriam da responsabilidade da SAD”.
      O que justifica, então, este aumento?



  2. Deslocações e estadias: +219%

    • De 19 mil para 60 mil euros

    • Estimativa: €45.000

    • As equipas competiram nos mesmos campeonatos — o que explica este salto?


  3. Gastos com pessoal: +99%

    • De 26 mil para 51 mil euros

    • Estimativa: €35.500

    • Foram contratadas novas funcionárias, apesar de haver menos trabalho direto devido à criação da SAD.
      Algumas desempenham funções também para a SAD — será o clube a suportar esses custos?



  4. Despesas de representação: quadruplicaram.


  5. Artigos de oferta: ultrapassaram os 18 mil euros.


  6. Rubricas “Outros” — sem explicação detalhada — somam cerca de 53 mil euros.


  7. E, para terminar, um exemplo que ilustra bem a falta de rigor:
    A previsão para eletricidade e água era de 25 mil euros.
    O gasto real? €172,40.

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Conclusão

Falta planeamento.
Falta rigor na orçamentação.
E falta visão — para não dizer outra coisa.

O centro de custos é desproporcional e a transparência continua a ser um conceito muito relativo. É difícil para os sócios compreenderem toda esta estrutura; mas é fácil, para quem gere, gastar enquanto há liquidez imediata.

Outro ponto relevante: deixou de ser apresentado o indicador de solvabilidade, que mede a capacidade do clube cumprir as suas obrigações a longo prazo.

Por fim, nota-se um detalhe preocupante:
As dívidas a liquidar no próximo ano aumentaram de €574 mil para €627 mil, apesar de o saldo contabilístico ser positivo em €290 mil.
Ou seja: temos lucro no papel, mas mais dívida para pagar a curto prazo.

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Um relatório que, mais do que números, revela uma gestão sem rumo.
E um clube que parece viver à boleia do curto prazo — com cada vez menos visão e cada vez mais justificações.