17.7.23

O que aconteceu com a contratação de Olinga

Para melhor compreender o que se passou com uma situação insólita no futebol português, procurei o despacho do Tribunal da FIFA (setembro de 2022, sob o nome Essono) e encontrei esta argumentação:

1. a 1/12/21 o Raja enviou a Olinga uma oferta de contrato. O texto dizia 'Oferta' e discriminava os valores a pagar por época e meia;

2. Olinga assinou e escreveu "para aceitação", o Raja também assinou. Depois disso, Olinga enviou várias mensagens de Whatsapp em que expressava a sua satisfação por ir jogar no Raja.

3. posteriomente, Olinga terá ligado (o acórdão diz 'alegadamente') a dizer que apenas estava a aceitar abrir negociações e que assinou o papel apenas para acusar a receção do documento;

4. a 6/12/21 o Raja pediu um visto para Olinga entrar em Marrocos e Olinga foi entrevistado pelo cônsul na Bélgica a 8/12/21; o visto foi enviado no dia seguinte a Olinga;

5. O Raja comprou bilhetes de avião e enviou-os a Olinga;

6. a 19/12 Olinga diz ao Raja que não recebeu o contrato-padrão (standard form FRMF contact) e faz várias perguntas (sobre a duração, os valores. etc); o presidente do Raja responde via Whatapp no dia seguinte;

7. nesse mesmo dia (20/12/21), Olinga responde que já não quer jogar no Raja. argumentando que a família tem outros interesses;

8. e nesse mesmo dia ainda Olinga e o Rio Ave assinam um contrato de época e meia;

9. a 24/12 o Raja diz que viu uma notícia da contratação, acusa Olinga de incumprimento e notifica disso também o Rio Ave (deixo o texto original para melhor elucidação por parte de juristas "On 24 December 2021, the Claimant put the Respondents in default for compensation due to breach of contract by the First Respondent [Olinga], and inducement thereto by the Second Respondent [Rio Ave FC]")

10. a 11/1/22 o Rio Ave enviou um e-mail ao Raja em que diz que desconhecia a existência da Oferta no momento da assinatura com Olinga.

11. finalmente, a 24/1/22, o Raja entra com uma queixa na FIFA.

Os principais argumentos do Rio Ave, enviados à FIFA, são:

12. Olinga não assinou qualquer contrato com o Raja (pelo menos não manifestou a sua 'aceitação expressa') e as mensagens trocadas entre Olinga e o Raja mostram que o negócio nunca esteve fechado e que faltariam os exames médicos.

13. o Rio Ave não tinha conhecimento da existência da Oferta no momento da assinatura com Olinga, tendo apresentado como prova uma captura de écrã, "de uma data não especificada em janeiro de 2022" do arquivo no Transfer Matching System (TMS), além do e-mail de 11/12

A decisão da FIFA, como se sabe, foi na primeira instância (e posteriormente em recurso) desfavorável ao Rio Ave:

14. a FIFA considera que o que Olinga escreveu/assinou é a base de um contrato de trabalho (está assinado, tem a duração e a remuneração previstas);

15. As provas que o Rio Ave enviou (a captura de ecrã e o email) não foram tidas em conta por irrelevância;

Chegados a este ponto, e para quem não é jurista, ficam algumas dúvidas: 

- Olinga terá sido honesto com o Rio Ave? Até dia 24/12 o Rio Ave não tinha indicações de que o jogador tinha esse 'compromisso' com o Raja?

- a comunicação dor Raja de 24/12 não deveria ter travado de imediato a contratação do jogador?

- se o jogador era assim tão importante (e não era, na verdade!), não seria de ter contactado o Raja e, eventualmente, negociado com eles?

O comunicado deste fim de semana diz que o Rio Ave FC considera que a sua atuação não incumpriu os regulamentos da FIFA e, portanto, a penalização sofrida é injusta e excessiva. Ainda assim, a mesma será cumprida escrupulosamente e os processos internos serão reforçados de forma a que uma situação similar não se volte a repetir.